Previdência (I): cálculo da contribuição

Com juros menores, a questão é inexorável: ter a mesma aposentadoria irá requerer maior esforço de poupança

13/08/2014 – VALOR ECONÔMICO

Por Fabio Giambiagi

Inicio hoje um conjunto de 8 artigos (um por mês) para compartilhar com os leitores as preocupações resultantes dos efeitos da queda dos juros sobre os requisitos contributivos do sistema de Previdência Complementar, quando os juros de longo prazo voltarem a cair no Brasil, talvez em 2016.

Depois da nota de hoje, pretendo expor o cálculo da aposentadoria complementar em diferentes cenários; o valor da poupança acumulada necessária para diferentes aposentadorias; o capital acumulado após 35 anos de contribuição em diversos cenários; a alíquota de equilíbrio atuarial; a mudança operada no fluxo de caixa em função de diferentes taxas de juros; a importância do incremento da contribuição; e os efeitos do aumento da sobrevida.

Começo hoje com o cálculo do valor do depósito mensal necessário para ter uma renda complementar X a partir de uma idade Y por um período Z de anos. Os resultados expostos são uma variante das tabelas apresentadas no livro "O futuro é hoje", publicado há alguns anos pela Editora Campus, cujos créditos devo compartilhar com meu amigo e co-autor, Roberto Zentgraf.

O denominador comum desse conjunto de artigos será a tentativa de chamar a atenção do leitor acerca de como a queda da taxa de juros que poderá se processar na economia brasileira, no dia em que país dê certo, teria que alterar a disposição a poupar dos indivíduos que almejam ter uma renda complementar quando se aposentarem.

Ter taxas de juros "civilizadas" era, há muitos anos, uma aspiração nacional, depois de 20 anos de taxas de juros altíssimas, inicialmente para tentar fugir da hiperinflação em 1991 - quando esse ciclo, historicamente, se iniciou - e depois como forma de conservar uma inflação baixa, nos primeiros 15 anos da estabilização. Nada mais natural, portanto, do que considerar positivo para o país poder ter um dia um juro real duradouro, em termos reais, de 3 % ou 4% em vez das taxas de 10 ou 15 % que chegamos a ter na fase mais "hard" da batalha pela estabilidade.

Nem tudo são flores, entretanto. Deixando de lado a discussão sobre qual o nível da taxa no curto prazo para combater da melhor forma a inflação, o que se pretende com este conjunto de artigos é mostrar para o leitor que a parcela da sociedade capaz de poupar terá que mudar os seus hábitos, se ao se aposentar pretender ter a mesma renda que até agora vinha sendo garantida por taxas de juros elevadas.

Não é difícil entender por que. Numa situação de juros reais nulos e deixando de lado a inflação, uma pessoa que quiser receber R$ 1.000 durante 25 anos a partir dos 60 anos de idade e começar a contribuir aos 20 anos, durante 40 anos, terá que contribuir exatamente com R$ 625 por mês entre os 20 e os 60 anos. Por que? Porque esse valor, multiplicado por 12 contribuições, durante 40 anos, lhe permitirá acumular R$ 300 mil, o que nos 300 meses compreendidos nos 25 anos do usufruto da aposentadoria complementar gerariam renda de R$ 1.000 por mês.

Se o dinheiro que ele colocar no banco, além de estar mais seguro nele, render um retorno real, a mesma renda complementar poderá ser obtida por depósitos mensais menores, uma vez que o rendimento propiciado pelos juros estará fazendo parte do trabalho da poupança do indivíduo. Quanto maiores forem os juros, menor terá que ser o esforço de poupança da pessoa em relação ao seu salário.

A tabela calcula o valor do depósito requerido para ter uma renda complementar de R$ 5.000 entre os 60 e os 85 anos de idade. Com base no exemplo acima, para as condições de quem começa a contribuir aos 20 anos com juros nulos, o depósito então deve ser de 5 vezes R$ 625, ou R$ 3.125.
Observe o leitor, porém, que se taxa de juros real for de 6 %, o valor do depósito mensal cai para apenas R$ 413. Quanto mais tarde a pessoa começar a contribuir, maior tende a ser o esforço de poupança que ela deve fazer para compensar o tempo perdido. O que interessa, no caso, é ressaltar o que acontece quando a taxa de desconto atuarial cai de 6 % para 4 %: no caso de quem começa a contribuir aos 20 anos, a contribuição dobra! Ela passa de R$ 413 para R$ 822 mensais. Com juros menores, a questão é inexorável: ter a mesma aposentadoria futura irá requerer poupar mais. É bom nos prepararmos para isso. Voltaremos a este ponto ao longo dos próximos meses.

Fabio Giambiagi, economista, coorganizador do livro "Economia Brasileira Contemporânea: 1945/2010" (Editora Campus), escreve mensalmente às quartas-feiras. E-mail: fgiambia@terra.com.br.