Teto de gasto exigirá austeridade em 2018

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O próximo presidente da República assumirá um governo mais austero, caso o limite para o crescimento dos gastos públicos seja aprovado pelo Congresso Nacional e a reforma da Previdência saia do papel. Especialistas avaliam que, se as medidas sugeridas pela gestão de Michel Temer receberem o aval dos parlamentares, a forma como os políticos farão a campanha eleitoral de 2018 terá de ser repensada. Não haverá espaço fiscal para promessas vazias e mirabolantes porque o Executivo não terá flexibilidade para aumentar as despesas. Programas bens estruturados, eficiência da máquina pública e avaliação dos projetos serão as novas palavras de ordem.
No mercado, os analistas começaram a refazer as projeções para o tamanho do deficit fiscal nos próximos anos, levando em consideração as medidas anunciadas. A expectativa é de que o rombo nas contas públicas caia de R$ 170,5 bilhões em 2016 para até R$ 70 bilhões em 2017. E o tempo que o governo levará para fazer superavit primário dependerá de medidas adicionais, sobretudo se houver aumento de impostos.
O especialista em contas públicas Raul Velloso explicou que o projeto do governo faz com que cada componente do gasto seja corrigido apenas pela inflação do ano anterior, congelando qualquer crescimento real. "Para funcionar, é preciso que haja alteração também na forma de correção dos gastos com saúde e educação, que hoje são reajustados pelo aumento de receita. Assim, se a inflação do ano anterior for, por exemplo, de 10% e o aumento de receita, de 15%, vai sobrar dinheiro em caixa. Porém, se não houver essa alteração, vai ser complicado", alertou.
Velloso afirmou que o sucesso da proposta também depende da aprovação da reforma da Previdência. "Apesar de o efeito ser mais lento, mais a longo prazo, a ideia é que o reajuste dos benefícios também sejam vinculados à inflação do ano anterior. Ainda assim, sempre vai haver um número de aposentados entrando na Previdência, portanto, é preciso encontrar algum tipo de controle para isso também", disse. A principal vantagem do projeto, na opinião do especialista, é que ele vai garantir que a composição do gasto se mantenha inalterada. "Se crescer mais de um lado, terá que cortar de outro. O governo vai ter que equilibrar isso internamente", destacou.
Na opinião da economista Margarida Gutierrez, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a farra fiscal dos últimos cinco anos levou o país para uma situação insustentável. Conforme ela, a trajetória de crescimento da dívida bruta em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) chegará a 90% caso as medidas sugeridas pela equipe econômica de Temer não sejam aprovadas pelo Congresso. "A disciplina fiscal terá de ser resgatada pelo próximo governo para que o Brasil volte a crescer, gerar empregos e receber investimento", disse.
Ela comentou que o país deve voltar a fazer superavit primário a partir de 2019, com a recuperação da confiança que levará empresários a produzir e consumidores a comprar. Entretanto, ela destacou que não sobrará tanto dinheiro como alguns projetam, já que o esforço fiscal deverá ser de pelo menos 6% do PIB para cobrir o rombo atual e pagar os juros da dívida. "Os efeitos das medidas serão de médio e longo prazos e não levam em consideração o aumento de impostos. O ajuste fiscal tende a ser mais lento, mas bem estruturado. A nova equipe econômica é competente, mas agora depende de ajuda do Congresso para tirar as medidas do papel", afirmou.
Para o professor de Administração Pública da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira, as medidas anunciadas pelo governo só funcionarão se aprovadas no seu conjunto. "Se aprovar a limitação do gasto de um lado, mas não promover reforma na Previdência e nem desvincular os gastos com saúde e educação, quem assumir o governo em 2018 vai ficar com uma camisa de força", assinalou.
Camisa de força
Matias-Pereira ressaltou que, das sete medidas anunciadas pela equipe econômica, cinco precisam passar pelo Congresso Nacional. "Portanto, o parlamento é que vai decidir o futuro da gestão Michel Temer. A alteração da meta fiscal já deu mostras de que existe uma força política, essencial para aprovar o conjunto de medidas", sustentou.
O professor arrisca projetar um deficit entre R$ 70 bilhões e R$ 80 bilhões para 2017. "É preciso ver como a economia vai reagir se as propostas forem aprovadas. Se o PIB vai voltar a crescer. A confiança é fundamental para isso. Só assim os empresários vão aumentar a produção e as famílias voltarão a consumir", assinalou. Matias-Pereira alertou, contudo, que o deficit de 2016 ainda é inquietante. "Existe a assombração da Eletrobras. E os balanços da Caixa sinalizam necessidade de capitalização. Isso sem falar em BNDES e Banco do Brasil que são outras caixas de pandora", observou.
Reforço
Além de anunciar as propostas que dependerão de apreciação do Congresso, o governo de Michel Temer pretende reforçar o caixa do Executivo. A primeira medida prevê que o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) pague R$ 100 bilhões de dívida ao Tesouro Nacional. Os desembolsos serão feitos em três parcelas anuais. A primeira, ainda em 2016, será de R$ 40 bilhões e as restantes de R$ 30 bilhões. Além disso, o Ministério da Fazenda extinguirá o fundo soberano e devolverá à conta única R$ 2 bilhões.
Controle de despesas
A execução de reformas e a redução de despesas são essenciais para o controle de gastos públicos, alertam os especialistas. Segundo Geraldo Biasoto Jr., professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e ex-coordenador de política fiscal da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, estabelecer limites é sempre um problema. Mas, como os governos recentes inflaram as despesas, a base já está bastante dilatada, e existe espaço para redimensionamento. "De 2013 para 2015, o gasto da máquina pública passou de 3,5% para 5,3% do PIB (Produto Interno Bruto)" disse.
Biasoto acredita que o governo Temer não vai conseguir aprovar mudanças na Previdência até 2018. E nem deveria promover a reforma neste momento, apesar de a seguridade social ser responsável pelo maior rombo das contas públicas. "O que pressionou a Previdência foi a política de reajuste do salário-mínimo pelo crescimento do PIB. Agora, o problema é que pode se acelerar a busca pela aposentadoria, como ocorreu na última reforma da Previdência", ponderou.
Para o economista Carlos Thadeu Filho, sócio da MacroAgro Consultoria, sem a reforma da Previdência e a desvinculação de gastos da saúde e da educação, o estabelecimento de teto para os gastos públicos perde o seu propósito. São mudanças essenciais, alertou, para o país reduzir o nível de endividamento em relação ao PIB. "O governo precisa aprovar essas medidas para que deixe claro ao mercado que está comprometido em ajustar as contas públicas", disse. (ANTONIO TEMÓTEO e SIMONE KAFRUNI - Correio Braziliense-27.05)